Quatro anos depois do lançamento do programa Oeiras Valley, o Presidente da Câmara Municipal de Oeiras, Isaltino Morais, faz o balanço desta estratégia e recorda algumas das principais iniciativas que transformaram Oeiras nas últimas décadas.
Oeiras tornou-se o local de eleição para o setor empresarial, desde multinacionais a novas empresas, sendo o 2º município do país em termos de volume de negócios não financeiros e o 3º em termos de contribuição para o PIB do país. Mas tornou-se também um local atrativo para as pessoas. Oeiras tem 115 estabelecimentos de ensino, uma área verde urbana correspondente a 15% do concelho e uma dinâmica cultural atrativa.
Em entrevista ao Oeiras Valley, o Presidente da Câmara Municipal de Oeiras, Isaltino Morais, faz o balanço da estratégia Oeiras Valley, desde a aposta do município na cultura, na habitação pública e na digitalização.
Assista ao vídeo da entrevista aqui.
O programa Oeiras Valley já conta com mais de quatro anos desde o seu lançamento. Quais considera ser as principais conquistas deste programa para o município?
Muitas. O programa Oeiras Valley começou há quatro anos, embora a ideia estivesse a germinar há muitos mais. A ideia de desenvolver aqui um hub tecnológico, uma plataforma propícia e favorável ao desenvolvimento e à instalação de atividades na área das empresas de base tecnológica, na área da educação, com algumas instituições universitárias, escolas internacionais, institutos de investigação e universidades – tudo isto associado – já era um propósito de há muitos anos.
Aliás, Oeiras tem um acordo de cooperação com São José, na Califórnia, onde se situa Silicon Valley e, naturalmente, foi uma fonte de inspiração o facto de sabermos o que aconteceu em Silicon Valley a partir dos anos 70, particularmente. E quando, por volta dos anos 90, iniciámos a construção do TagusPark, estavam na moda por essa Europa fora os parques tecnológicos, designadamente a Sophie Antipolis, em Nice, em Grenoble, em Manchester. Um pouco por toda a Europa, nas grandes cidades, estava a surgir este tipo de parques tecnológicos. Portanto, a Câmara Municipal, quando avançou com o TagusPark, naturalmente, em simultâneo, avançou também com outros parques empresariais, como foi o Lagoas Park, a Quinta da Fonte, o Aquiparque ou o Parque Suécia, ou seja, uma gama de espaços destinados a acolher as empresas de valor acrescentado.
Em simultâneo, investimos fortemente na educação, na criação de equipamentos importantes na área da cultura, do desporto, da área social. O que quer dizer que se requalificou muito [território] – já antes tínhamos procedido à requalificação do território, com o realojamento das famílias que viviam em barracas.
Quando, há quatro anos, lançámos este conceito, esta ideia do “Valley”, muita gente se questionou. É preciso termos a consciência que, hoje, Oeiras é o segundo município na geração de riqueza em Portugal, logo a seguir a Lisboa. O volume de negócios é um indicador, mas depois há um indicador que tem a ver com a qualificação das pessoas que aqui vivem. Ao nível da educação, também criámos condições que noutros municípios não existem. Hoje, os jovens que terminam o 12.º ano aqui no concelho têm acesso à universidade. Todos sem exceção porque o município suporta o custo das propinas.
Portanto, o “Valley” é todo este ambiente de predisposição para o desenvolvimento tecnológico e para a investigação. Nestes quatro anos, um longo percurso foi percorrido e consolidou-se esta ideia do Oeiras Valley. E é por isso que aumentaram substancialmente os investimentos.
São já várias as escolas internacionais que vêm para Oeiras e que já cá estão. Entretanto, instalou-se a Sharing School, que é uma das melhores escolas internacionais da Europa. Ao longo do próximo ano, possivelmente, virá instalar-se outra escola internacional. O que quer dizer que Oeiras ocupará o terceiro lugar no país com maior número de escolas internacionais ao nível do 12.º ano.
As universidades que aqui estão têm vindo a aumentar o número de faculdades que vão sendo criadas. Recentemente, numa das universidades, foi aprovada a Faculdade de Farmácia. Vai ser feito um grande investimento onde a própria Câmara Municipal está envolvida com a Universidade Católica: vai haver obras num dos edifícios e um dos centros de investigação da Universidade Católica vai ficar aqui. Mas, ao mesmo tempo, está prevista uma parceria com a Católica, com a Universidade Nova, através do ITQB, que vai nascer justamente aqui, nas instalações da antiga Estação Agronómica Nacional. Por outro lado, uma outra faculdade ligada à Universidade Nova também vai sediar-se aqui em Oeiras. Provavelmente, a Câmara irá ter uma comparticipação na instalação dessa faculdade, na ordem dos 15 milhões de euros. Portanto, Oeiras é, indiscutivelmente, o Município de Portugal que mais dinheiro destina ao investimento na área da investigação fundamental nas diferentes instituições que aqui estão sediadas.
Ainda ontem tive conhecimento – e com isto diria tudo sobre o que é Oeiras Valley – da aprovação, por parte da União Europeia, da disponibilidade de candidaturas para todos os territórios, ou seja, regiões e municípios, que sejam “Valleys”. É a própria União Europeia que vem reconhecer este conceito e o seu conteúdo. O conteúdo do “Valley”, de Oeiras Valley,significa inovação, significa tecnologia, significa investigação, significa ciência, significa empreendorismo, significa dinâmica.
Hoje, Oeiras Valley está perfeitamente integrado no léxico das empresas que estão sediadas aqui no concelho e, portanto, é muito vulgar nas apresentações internacionais que elas fazem. Já não é Oeiras: é Oeiras Valley.
É indiscutível que o que começou por ser uma tentativa de marca para atrair empresas, para acentuar a importância das instituições de investigação em ciência e de educação, foi atingido com pleno sucesso.
De que forma é que a aposta do município na cultura tem vindo a complementar o desenvolvimento económico e social do concelho?
Naturalmente, há mudanças na sociedade e Oeiras é um laboratório fantástico. Nos anos 90, os jovens que ganhavam muito dinheiro, normalmente, exibiam-no. Havia uma demonstração exterior de riqueza extraordinária. Hoje em dia, os jovens mudaram e o jovem tecnológico, o tecnólogo, aquele que realmente está hoje nas empresas tecnológicas, tem mais sede de cultura e de atividade desportiva do que nos anos 90. O que é que privilegia agora? Não é só o ambiente. O ambiente – a qualidade ambiental no sentido estrito do termo – é importante na mesma, talvez mais importante ainda, mas há uma apetência por produtos culturais, por produtos desportivos, proximidade por produtos culturais, proximidade por produtos desportivos.
Há realmente também muita gente nova e, sobretudo, muitos jovens que trabalham nas empresas aqui do concelho e querem ter proximidade de produtos culturais, produtos desportivos, de bom ambiente, de ciclovias e de mobilidade suave. Há uma mudança dos gostos e do perfil das pessoas muito grande. O ritmo da mudança é muito grande. E julgo que este é um mérito do município.
Nós apostamos muito na qualificação das pessoas. Oeiras é hoje o município, em termos de comunidade humana, mais qualificado do país, em todos os sentidos. Não é só no problema da literacia, nem só na questão do número de licenciaturas. Há aqui uma classe média muito forte que decorre das ocupações das funções que as pessoas realmente têm. Com o investimento, com a aposta que a Câmara Municipal faz na educação, o distanciamento de Oeiras relativamente a outro municípios vai ser cada vez maior.
Oeiras transformou-se num município onde as pessoas querem viver. Quais é que foram as iniciativas que impulsionaram este movimento e levaram a esta transformação?
As pessoas gostam de viver e de trabalhar em lugares agradáveis e aprazíveis. Uma das coisas que mais contribuiu para a transformação do território de Oeiras e das comunidades, curiosamente, foi o esforço que fizemos para erradicação da pobreza. A pobreza, muito visível nos anos 80, era espelhada nos bairros de barracas que existiam. Oeiras tem uma posição estratégica muito boa porque está na capital, está no olho do furacão. Só o posicionamento estratégico, por sua vez, é já fundamental. Por outro lado, obviamente, era importante tirar partido dessa localização, da proximidade aos centros de decisão.
Até aos anos 80, Oeiras conformou-se a ser dormitório. Tinha sido durante centenas de anos uma espécie de celeiro e estava condenada, a partir dos anos 60, a ser um dormitório de Lisboa. A mudança que aconteceu a partir de meados dos anos 80 foi que não nos conformámos a ser dormitório. Passámos a dar prioridade não à construção de habitação, mas à construção de edificações destinadas à criação de riqueza, às empresas. E foi esse o grande salto qualitativo que foi dado.
Mas, para as empresas, virem era necessário que o território fosse possível. Era fundamental erradicar todas aquelas manchas que estavam no território e que não permitiam o seu desenvolvimento. Foi por aí que começámos. Oeiras tornou-se apetecível e as pessoas hoje gostam de viver e gostam de trabalhar aqui.
Aliás, o preço das casas e das rendas aumentou de tal forma que se torna difícil uma família de baixo rendimento alugar aqui casa ou comprar casa. E essa é a razão também pela qual Oeiras está a fazer o maior número de habitação pública deste país. Oeiras é o décimo município mais populoso do país, mas somos o terceiro em habitação pública. É Lisboa, Porto e, a seguir, é Oeiras. Em termos percentuais, até temos mais [habitação pública] do que Lisboa e Porto, porque temos 5% já de habitação pública. Portugal tem 2%. Lisboa, Porto, Oeiras são os municípios que mais constroem.
A habitação pública em Oeiras é uma prioridade. Razão pela qual temos já aprovadas cerca de 1.500 casas, entre a Câmara e o IHRU. Tenho andado numa luta pela desafetação de terrenos rústicos para construir habitação pública e está neste momento uma proposta de lei na Assembleia da República, que espero que venha a ser aprovada, justamente para nos permitir lançar mais 1.500 casas. O que quer dizer que, no nosso horizonte, está a construção de, nos próximos oito a nove anos, cerca de mais 3.000 casas.
É toda esta requalificação de território, do ponto de vista ambiental, da oferta de equipamentos, de começar por ter boas escolas – e agora por parte da escola pública, vêm as escolas privadas e internacionais. Diria que não é uma coisa: é tudo. Tudo é que constitui a atração para as pessoas.
Já temos o maior número de árvores por habitante. Aliás, é muito difícil, hoje, no nosso concelho, por exemplo, encontrar um papel no chão. É difícil nós percorrermos 100 ruas deste concelho, sempre seguidas, e encontrarmos uma rua que não tenha árvores. Foram plantadas milhares e milhares de árvores. Houve planeamento e houve ordenamento do território. Desse planeamento, resultou o ordenamento do território. Se nós fizermos um voo de helicóptero em toda esta zona, notamos perfeitamente a diferença. Aqui em Oeiras, as coisas estão arrumadas. Esta é a grande vantagem do ponto de vista do ordenamento do território do concelho. E é isto, no fundo, que o qualifica e que lhe dá atração para as pessoas poderem vir para aqui viver.
Na sua opinião, o exemplo de Oeiras aplicado a outros municípios poderia ajudar a resolver o problema da habitação em Portugal?
Podia. Não ajudava: resolvia. Fala-se muito na desertificação do interior e que é preciso ocupar as casas de interior. Onde estão os empregos no interior? O fenómeno da atração das cidades é mundial. É claro que há medidas de fixação de populações no interior, mas que não são significativas. Podem-se criar universidades que funcionem, que dão vida às cidades, mas depois essas cidades não têm capacidade para absorver os licenciados que formam e depois eles têm que ir para fora.
Um privado faz habitação para ganhar dinheiro e faz habitação para quem tem dinheiro para comprar ou para arrendar. Há uma classe média que tem dinheiro e pode comprar casa e pode arrendar. Depois há um grupo de famílias de classe média-baixa, que não têm condições nem de arrendar nem de comprar aos preços que estão as casas na Área Metropolitana de Lisboa. Para esses, tem de haver habitação pública. A habitação pública tem que ser construída pelo Estado e pelas Câmaras Municipais.
A digitalização tem sido uma imagem de marca do município ao longo dos anos. É exemplo disso o VisitOeiras, a plataforma “O Meu Bairro”, mas também a digitalização de processos municipais. Na sua leitura, quais foram os principais contributos da digitalização para o município?
A transição digital é determinante para a conetividade entre as pessoas, as empresas e a comunidade em geral. Sobre essa vantagem, está à vista. Há aspetos da transição digital que podem ser negativos, mas isso é outra questão – faz parte do regime democrático. O que importa é a transição digital do ponto de vista das ferramentas que coloca à disposição da sociedade, das empresas, das instituições e o que isso representa de evolução na prestação de serviços às pessoas e à comunidade.
Sempre olhei para as diferentes ferramentas tecnológicas, sejam aplicações, sejam as diferentes plataformas que o Município dispõe, no sentido de, por um lado, facilitar e agilizar toda a atividade da Câmara Municipal, facilitar a vida das pessoas. Ainda sou do tempo em que, para qualquer assunto, as pessoas tinham de vir à Câmara. Havia filas enormes nos diferentes serviços de atendimento. Hoje em dia isso já não se vê. Há milhares de atendimentos pela via dos dispositivos tecnológicos.
Oeiras fez um percurso significativo nas mais diferentes áreas. A mais recente foi ao nível dos projetos urbanísticos: neste momento, as coisas estão organizadas de maneira a que o cliente tenha à sua disposição, à distância de um clique, a possibilidade de saber onde é que o processo está. Tudo isto é realmente um mundo novo e que pode eventualmente traduzir-se no futuro e numa poupança significativa.
Ainda estamos numa fase, todos nós, de grande investimento em software, em hardware, na formação das pessoas. A Câmara Municipal também é uma escola de formação na área das tecnologias de informação. Há algumas aplicações que são muito importantes e tudo isto visa aproximar a decisão das pessoas. A aplicação do VisitOeiras é muito acessível, tem muita informação e, sobretudo, é uma informação que permite estabelecer ligações.
Quando se fala em transição digital não é apenas a eliminação do papel e a utilização intensiva do digital. É também a facilidade de comunicação, a ligação das pessoas e, sobretudo, a prestação dos serviços online. Numa organização como a Câmara Municipal, a prestação de serviços online é um salto qualitativo extraordinário, pelo tempo que poupa às pessoas, pela facilidade e pela celeridade na resolução dos processos.
Como é que idealiza Oeiras daqui a 10 anos?
Não imagino, não imagino. Seria mais difícil imaginá-la daqui a 100 anos. Mesmo no tempo acelerado que vivemos, dez anos não é muito tempo. Dez anos é o tempo suficiente para o SATU estar a funcionar, para o Centro de Congressos estar pronto, para a Praça dos Lusíadas estar pronta, para a Praça da Música estar pronta, para o Rossio de Porto Salvo estar pronto, para 3.000 casas de habitação pública estarem prontas. É um horizonte para isto. Para mais três campos de futebol estarem prontos, mais algumas escolas novas concluídas, outras requalificadas. Dez anos já é um período significativo desse ponto de vista.
Daqui a dez anos, Oeiras estará ainda melhor do que está hoje. Teremos mais uns milhares de árvores plantadas. Do ponto de vista tecnológico, vai haver avanços muito significativos, nesses dez anos, mas ainda não vamos ter, nesses dez anos, os robots aí nas ruas. Mas admito que daqui a 50 anos isso possa ser possível.
Daqui a 50 anos, é imprevisível, sobretudo, porque há aqui uma variável que não dominamos e que tem a ver com a guerra. É preocupante, naturalmente, o que vai acontecer ao nível das alterações climáticas e que reflexos isso vai ter nas nossas vidas. Agora, o que é imprevisível é a sociedade planetária em que vivemos atualmente. A imprevisibilidade está no acerto de poderes a nível mundial.
Ainda bem que nós não podemos prever o que vai acontecer daqui a 50 anos. Se fôssemos capazes de prever o futuro, entrávamos em depressão. O que é preciso é que seja melhor do que é hoje. E eu acredito que sim.