
Professora Catedrática do Instituto de Tecnologia Química e Biológica António Xavier (ITQB NOVA) e coordenadora de um laboratório associado LS4Future, Inês Cardoso Pereira é ainda responsável pelo laboratório de Metabolismo Energético Bacteriano.
Um dos projetos do laboratório de Metabolismo Energético Bacteriano que destaca passa por estudar uma enzima importante das bactérias anaeróbias que tem uma elevada capacidade de reduzir CO2. Doutorada pela Universidade de Oxford, Inês Cardoso Pereira considera que o ambiente do ITQB-NOVA é “fantástico” e tem “um caráter muito multidisciplinar”, considerando que Oeiras tem “um ecossistema de investigação muito rico, e em expansão”, com “um grande apoio da Câmara Municipal de Oeiras”.
Conheça melhor o laboratório de Metabolismo Energético Bacteriano através das palavras de Inês Cardoso Pereira, o “Rosto da Ciência” que é responsável por este departamento.
Quais são as principais linhas de investigação do laboratório de Metabolismo Energético Bacteriano?
O nosso laboratório estuda um grupo de bactérias anaeróbias, ou seja, bactérias que usam compostos de enxofre para respirar, em vez de oxigénio. Estas bactérias encontram-se em muitos habitats naturais, desde sedimentos marinhos a solos e ao nosso intestino. Nós estudamos o seu metabolismo energético, pois procuramos perceber como obtêm energia a partir deste tipo de respiração, que resulta na produção de sulfureto – o qual pode ter consequências adversas se produzido em excesso, tanto a nível ambiental como da saúde.
Por outro lado, utilizamos estas bactérias, bem como proteínas isoladas das mesmas, para processos de biocatálise, que são processos em que usamos o sistema biológico (células ou proteínas) para efetuar transformações químicas relevantes, desde a remoção de poluentes ambientais à produção de hidrogénio ou conversão de CO2 em compostos de valor acrescentado.
Que projetos desenvolvidos no laboratório gostaria de destacar?
Temos vários projetos a decorrer no laboratório, mas posso destacar três que são ilustrativos. No primeiro estamos a estudar uma bactéria intestinal, que diversos estudos mostraram que se torna mais abundante no intestino com o consumo de uma dieta rica em proteína animal e gorduras e pobre em fibra. Esta bactéria leva a níveis mais elevados de sulfureto no intestino, com consequências nefastas para a saúde, nomeadamente ao nível de doenças inflamatórias do intestino, doenças cardiovasculares e cancro. Nós estamos a estudar como esta bactéria interage com as células epiteliais do intestino e quais os mecanismos patogénicos por ela utilizados.
Num outro projeto estudamos uma enzima importante destas bactérias que tem uma elevada capacidade de reduzir CO2 de um modo muito eficiente e específico, o que é difícil de conseguir quimicamente. Nós estudamos o mecanismo utilizado por esta proteína para ativar e reduzir o CO2 e desenvolvemos sistemas catalíticos sustentáveis que nos permitem reduzir este gás eficientemente, a partir da luz ou eletricidade verde.
Por fim, num projeto recente desenvolvemos um biocatalisador híbrido baseado em nanopartículas semicondutoras. Essas nanopartículas são produzidas na superfície das bactérias, e permitem a produção de hidrogénio pelas bactérias diretamente a partir de luz solar, num processo sustentável, ou seja, que produz hidrogénio verde.
Como é que estes organismos e o seu estudo são relevantes no tratamento dos esgotos?
O tratamento de esgotos envolve uma série de processos biológicos, alguns dos quais em condições anaeróbias, que são essenciais para a remoção da matéria orgânica e outros nutrientes. No nosso laboratório, desenvolvemos um processo baseado nas bactérias que estudamos para remoção de micropoluentes presentes em baixa concentração nos esgotos, nomeadamente fármacos, como por exemplo antibióticos, esteroides e anticoncecionais, que importa remover no processo de tratamento.
De que forma é que a população de Oeiras pode beneficiar dos projetos desenvolvidos no laboratório de Metabolismo Energético Bacteriano?
Os nossos projetos têm um carácter global e podem beneficiar toda a população. Mas durante a pandemia trabalhamos diretamente para a população de Oeiras pois produzimos várias enzimas que foram utilizadas por colegas nossos do ITQB NOVA no desenvolvimento de um teste rápido de saliva para a deteção de COVID-19. Este teste foi utilizado nas escolas do Concelho de Oeiras e noutros rastreamentos da doença.
Que balanço faz até agora da sua experiência a liderar este laboratório e como perspetiva o futuro do trabalho desenvolvido?
Sinto-me muito privilegiada por poder ter esta profissão de investigadora e docente, que é muito gratificante, e também por poder fazê-lo num sítio tão especial como é o Instituto de Tecnologia Química e Biológica António Xavier da Universidade Nova de Lisboa. Este instituto tem um ambiente fantástico e um carácter muito multidisciplinar. Contactamos com colegas de áreas muito diversas, o que é muito enriquecedor para a nossa investigação.
Por outro lado temos a sorte de estar situados em Oeiras, onde existe um ecossistema de investigação muito rico, e em expansão, e que tem um grande apoio da Câmara Municipal de Oeiras. Isto é muitíssimo importante pois permite-nos ter muitas atividades de aproximação da ciência à sociedade e às escolas, que de outro modo não seriam possíveis de realizar. Eu sou coordenadora de um Laboratório Associado chamado LS4Future, focado nas ciências da vida, que tem em Oeiras os seus parceiros ITQB NOVA, iBET e IGC, e que irá fortalecer muito a sua presença neste concelho, atraindo mais financiamento e investigadores nacionais e internacionais. Assim, vejo um futuro risonho e promissor para a investigação em Oeiras, onde tenho a sorte de viver e trabalhar.