
José Pereira Leal é o vice-presidente da P-Bio, uma associação que contribui para o desenvolvimento da Biotecnologia em Portugal, desde a sua fundação em 1999.
A P-Bio é uma associação que procura contribuir para a unificação e a afirmação do setor da Biotecnologia e Ciências da Vida em Portugal. Para isso, a P-Bio procura aumentar a visibilidade do setor em Portugal e no estrangeiro, enquanto visa contribuir para o desenvolvimento de políticas e medidas que apoiem o crescimento e a consolidação das empresas biotecnológicas nacionais.
Para cumprir a sua missão, a associação atua na promoção do empreendedorismo e desenvolvimento de negócios em Biotecnologia, atraindo investimento para este setor.
Conheça melhor a P-Bio através das palavras de José Pereira Leal, o “Rosto da Ciência” que lidera o desenvolvimento da Biotecnologia em Portugal.
Doutor José Pereira Leal, a P-Bio é uma associação com mais de duas décadas de trabalho para o desenvolvimento e suporte da Biotecnologia em Portugal. Quais são os propósitos e mais-valias da existência da P-Bio?
A biotecnologia, que vou definir aqui de forma muito informal como a formulação tecnológica, de soluções concretas que emana das ciências da vida, é uma área de enorme desenvolvimento internacional, que movimenta volumes de negócio e investimento estratosféricos, na casa dos milhares de milhões de euros em negócios de aquisição de empresas.
Um caso muito interessante que espelha bem o entusiasmo pela biotecnologia foi a tentativa de aquisição da GRAIL, uma empresa que desenvolveu um novo teste de diagnóstico de cancro, mas que ainda tem muito pouca validação clínica, pela Ilumina por 8$B (esta aquisição foi chumbada pela Comissão Europeia).
As empresas responsáveis por estes grandes negócios estão a desenvolver os novos fármacos, os novos diagnósticos, os novos alimentos, os novos processos industriais, as novas soluções ambientais, entre muitas outras áreas de grande impacto nas nossas vidas. São indústrias naturalmente baseadas em inovação. Em Portugal este setor é pequeno, mas temos empresas ativas em vários dos setores que mencionei acima.
A P-BIO surgiu pela necessidade de reunir estas empresas e dar voz a um setor com tanto potencial de impacto na nossa economia e nas nossas vidas. A P-BIO disponibiliza às empresas uma plataforma de diálogo e de discussão sobre os assuntos que maior importância aportam ao setor, tais como as questões de barreiras ou lacunas legislativas, dificuldades de acesso ao financiamento e a busca de mecanismos que permitam tornar as empresas biotecnológicas nacionais cada vez mais reconhecidas a nível mundial.
Quais são os principais projetos que a P-Bio está a desenvolver?
A equipa da P-BIO é pequena, mas a lista de projetos em desenvolvimento é longa. Um trabalho importante que a P-BIO iniciou há anos e mantém é uma caracterização do setor de forma quantitativa, que permita aos decisores políticos, à comunidade de investidores e à academia perceberem a dinâmica do setor no nosso país. É mais fácil tomarem-se boas decisões se forem baseadas em factos.
Uma outra aposta é no apoio à inovação e criação de novos negócios, para que a Biotecnologia possa ter em Portugal o impacto económico e social que tem noutros países. Para tal, estamos a tentar atacar dois problemas sentidos no setor. O primeiro é a falta de capital especializado, promovendo um encontro de bio investimento regular em Portugal que, com o apoio da Câmara Municipal de Oeiras, ambicionamos tornar um evento de referência. O segundo problema, para o qual tentamos contribuir na sua resolução, é a falta de experiência coletiva que existe no panorama nacional – inovar em biotecnologia não se faz na proverbial garagem às noites e fins de semana. É necessário conhecimento tecnológico avançado, equipamentos e instalações especializadas e know how de como criar serviços e produtos na área, com todas as suas características específicas regulatórias, temporais, sociais, entre outras. Temos muitos bons cientistas e instituições bem equipadas, mas poucas pessoas com experiência do “negócio” e, por isso, iniciámos um programa piloto de mentoria para ajudar os empreendedores a não repetirem os erros e as “asneiras” que nós, que andamos cá há uns anos, já fizemos.
Na P-BIO estamos organizados em grupos de trabalho por área, e em cada área temos projetos mais específicos. Não podendo descrever todos, deixo aqui só alguns.
Temos uma aposta de longa data nos medicamentos inovadores na área das doenças raras onde, recentemente, promovemos o Livro Branco das Doenças Raras e dos Medicamentos Órfãos.
Consideramos a biotecnologia verde estratégica e, por isso, estabelecemos uma parceria com o Crédito Agrícola colaborando no seu prémio anual (Prémio de Empreendedorismo e Inovação Crédito Agrícola) e uma parceria com a CAP (Confederação dos Agricultores de Portugal) para promover uma maior incorporação desta tecnologia na agricultura.
Na área da Saúde temos propostas estratégicas e agendas, podendo destacar a Estratégia Bio-Saúde 2030, que tem como visão tornar Portugal num exportador de soluções biotecnológicas na área da Saúde para o mercado global.
A P-Bio está a organizar o BIOMEET 2022, encontro anual do setor da Biotecnologia a decorrer em Oeiras, nos dias 19 a 20 de setembro, com o apoio do Município. O que levou a associação a escolher Oeiras como local para a realização deste evento?
Oeiras tem uma aposta nas ciências da vida de longa data, sendo a casa de instituições de investigação científica de referência, entre as quais se destacam o Instituto Gulbenkian de Ciência (IGC), onde liderei uma equipa de investigação por mais de uma década antes de me lançar no empreendedorismo biotecnológico, o Instituto de Tecnologia Química e Biológica da Universidade Nova de Lisboa (ITQB NOVA) e o Instituto de Biologia Experimental e Tecnológica (IBET). Estas são instituições que geram conhecimento e que são capazes de ser a base de novos projetos empresariais nesta área.
É pública a aposta do município de Oeiras no apoio à inovação nas ciências da vida com projetos pioneiros em Portugal, em colaboração com as intuições que mencionei acima. Recentemente, Portugal assistiu a uma ´exit´ muito emblemática e visível nas ciências da vida, com a compra da empresa Genibet pelo grupo Recipharm.
Finalmente, Oeiras é sede de muitas empresas multinacionais na área das ciências da vida, em particular na área da medicação. Todos estes factos contribuem para que Oeiras seja um concelho emblemático no nosso país na área das ciências da vida e, por isso, o palco natural para o evento que junta a comunidade inovadora das ciências da vida.
Quais as vantagens do trabalho em parceria com o Município de Oeiras?
Aquilo que percebemos foi a vontade do Município de Oeiras de apoiar a inovação e a especificidade desta área, e a vontade em trabalhar com os vários atores, nomeadamente associações empresariais como a P-BIO.
Mais ainda, será impossível desenvolver-se qualquer fileira tecnológica sem um grande envolvimento local e, nesse sentido, a vontade da CMO e as especificidades do concelho que mencionei acima, tem tudo para juntos podermos alavancar a biotecnologia como uma área de inovação tecnológica com grande impacto em Portugal.
Qual é o balanço que faz da sua experiência na P-Bio e como perspetivam o futuro da associação?
Pessoalmente é recompensador saber que estamos a dar um contributo para desenvolver um setor tecno-económico no país, mas ao mesmo tempo imensamente frustrante ver todas as oportunidades que temos e não aproveitamos.
De uma perspetiva mais futura, integro uma direção liderada pelo Presidente Simão Soares, da SilicoLife, e que termina agora o seu primeiro mandato. Se os nossos sócios nos mandatarem para continuarmos este trabalho, tentaremos terminar/concretizar vários dos projetos em curso, mas vou elencar uma direção que temos trabalhado internamente.
Sabemos bem o impacto que a Web Summit teve em Portugal e o impacto que uma imensidade de outros encontros especializados que se lhe seguiram têm nos setores mais associados à inovação nas TIC. Queremos criar essa dinâmica na biotecnologia.
O Biomeet que vem para Oeiras e esta nova dimensão de investimento são uma parte desta agenda, mas seria importante atrairmos para Portugal um ou mais eventos internacionais de referência, que nos mostrem ao mundo, e exponham a nossa academia, decisores e investidores a essas dinâmicas internacionais.