
O Diretor do ITQB NOVA partilha com o Oeiras Valley o posicionamento do instituto no panorama científico nacional e internacional, metas para o futuro e o contributo do Município de Oeiras para o desenvolvimento científico e tecnológico em Portugal.
Qual é o balanço que faz das projetos e atividades desenvolvidos pelo ITQB NOVA?
O ITQB Nova iniciou a sua atividade há quase 40 anos com um modelo de organização original no panorama nacional. No início, o Instituto funcionou como uma instituição aberta, tendo acolhido investigadores e docentes de várias universidades, o que permitiu construir um ambiente muito original, aberto e participado. Anos mais tarde, o ITQB foi integrado na Universidade Nova de Lisboa. Hoje somos uma unidade orgânica da Nova, totalmente alinhados com os objetivos e a missão da universidade.
Começando pelo ensino, a nossa atividade é totalmente dirigida à formação avançada – mestrados e doutoramentos – com maior incidência nos doutoramentos, em parceria com outras unidades orgânicas da NOVA, e outras instituições da área metropolitana de Lisboa. É um ensino diferente daquele que é habitualmente praticado, porque os nossos estudantes são emersos desde o início num ambiente de investigação, de procura e desenvolvimento do conhecimento. Esta ligação entre investigação e formação permite criar um ambiente de trabalho e de aprendizagem muito desafiante.
Em termos de investigação, os nossos pilares são o conhecimento dos processos e mecanismos fundamentais das Ciências Biológicas e da Química e a sua translação na criação de valor e de bem-estar social. Identificamos problemas com relevância social, mas o nosso ponto de partida é o conhecimento fundamental dos processos e dos mecanismos que lhe estão associados. Este conhecimento permite-nos, posteriormente, desenvolver mecanismos de inovação e de criação de valor que se possam traduzir na sua translação para aplicações reais.
O nosso terceiro eixo de atividade é focado na nossa relação com a comunidade. Estamos inseridos num município (Oeiras) que tem uma atitude muito proativa na partilha e difusão do conhecimento junto dos seus munícipes e nós próprios integramos muito esse espírito mantendo uma relação muito forte com a comunidade. Temos uma preocupação de partilha e de envolvimento com a sociedade na nossa atividade através de um conjunto alargado de programas – Ciência Cidadã, Cientistas vão à Escola, 90 segundos de Ciência, …. – e também do desenvolvimento de parcerias com as empresas, procurando a criação de valor e de bem-estar social. É esta a nossa matriz. Globalmente, diria que o balanço que fazemos desde a criação do ITQB NOVA é absolutamente excecional e quase único, através de um percurso muito invulgar no meio académico português.
Qual é o posicionamento do ITQB NOVA, no panorama nacional e internacional da investigação científica?
Em termos nacionais, somos uma instituição de referência. Foi um posicionamento conquistado ao longo do tempo, mas somos claramente uma instituição de referência no país.
O ITQB NOVA coordena duas unidades de investigação – a Mostmicro e o Green-It – e participamos numa terceira unidade (iNOVA4Health), todas classificadas de excelente, e coordena um laboratório associado (LS4Future) em parceria com outras instituições. Quando digo classificado de excelente, estou a mencionar a avaliação que é feita regularmente pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia, como recurso a painéis de peritos internacionais. Há, portanto, um reconhecimento internacional que resulta da atividade de um conjunto alargado de grupos de investigação do ITQB NOVA com grande reputação e reconhecimento internacional.
A nível institucional, penso que em Portugal falta ambição de dar escala e consolidar instituições fortes. Penso que no país sofremos sempre um pouco com isso, ou seja, temos sempre núcleos e focos de excelência, mas falta-nos capacidade de desenvolvimento de instituições e de ambientes, diria “hubs” de investigação, que nos permitam um posicionamento internacional de relevo. Penso que aqui tem havido alguma falta de ambição no país. A área metropolitana de Lisboa tem condições excecionais para se posicionar dessa forma, mas há trabalho a fazer, e é um trabalho que merece ser feito.
Já agora gostava de referir que o campus onde estamos vai sofrer alterações profundas. Para além das instituições que já cá estão – o ITQB NOVA, o IBET, e o INIAV – virão para o campus, o NIMSB (NOVA Institute for Medical Systems Biology) e a Universidade Católica Portuguesa. Estamos a falar precisamente de uma aposta que vem na direção que eu referi de procurar ganhar dimensão internacional. Iremos ter um campus científico renovado em Oeiras, acompanhado de uma grande ambição e uma grande expectativa.
By the way, I’d like to mention that the campus we’re on is going to undergo profound changes. In addition to the institutions that are already here – ITQB NOVA, IBET and INIAV – NIMSB (NOVA Institute for Medical Systems Biology) and Universidade Católica Portuguesa will be coming to the campus. We’re talking precisely about a commitment that goes in the direction I mentioned: working towards building an international dimension. We’re going to have a renewed scientific campus in Oeiras, accompanied by great ambition and expectation.
Quais são as metas para o futuro da Instituição?
O ITQB NOVA olha para si próprio em três escalas diferentes, mas complementares: uma escala regional, outra nacional, e uma escala internacional.
Na escala regional, parece-me muito importante reforçar a forma como o ITQB NOVA e o Município de Oeiras se têm vindo a relacionar e o impacto que temos tido na comunidade local. Termos a nível regional uma relevância e uma inserção fortes, não é de modo algum um contraponto à nossa projeção internacional.
A nível nacional, temos tido um conjunto de atividades científicas no ITQB NOVA que nos posicionam na liderança das áreas em que trabalhamos. Não só pela qualidade dos grupos de investigação que temos e da formação avançada que temos desenvolvido, mas também pela qualidade das nossas infraestruturas, em muitos casos infraestruturas únicas no país, as quais são disponibilizadas à comunidade científica e às empresas.
Finalmente, numa escala internacional, o ITQB NOVA tem sido uma instituição com grande visibilidade. Coordenamos um conjunto alargado de projetos que envolvem consórcios internacionais – só este ano temos seis novos grandes projetos internacionais coordenados pelo ITQB NOVA – e desenvolvemos um conjunto de atividades que, do ponto de vista científico, são relevantes tanto a nível nacional, como internacional.
A título de exemplo, o projeto europeu EvaMobs, que coordenamos, pretende desenvolver uma plataforma inovadora para desenvolver com rapidez biofármacos antivirais adaptáveis a diferentes vírus, integrando métodos avançados de design de proteínas, usando inteligência artificial, com robustas análises experimentais, culminando na validação por meio de ensaios clínicos.
O ITQB NOVA tem igualmente desenvolvido uma atividade intensa no estudo de bactérias, procurando compreender como funcionam, como se dividem e como se organizam. Tal é importante tanto para compreender o papel das bactérias no funcionamento normal do nosso organismo, como para entender como atuam em situações de doença. Um dos principais focos de interesse é perceber como podemos controlar as infeções bacterianas num cenário de cada vez maior resistência a antibióticos, um problema com grande relevância em termos de saúde pública.
Como trabalhamos no âmbito das Biociências moleculares num sentido lato, os nossos projetos de investigação não se limitam à área da saúde, abrangendo também áreas críticas relacionadas com a sustentabilidade, o ambiente e a produção de alimentos. Temos, por exemplo, projetos que partem do conhecimento fundamental, como a investigação sobre a tolerância de diferentes variedades de arroz a condições de seca ou temperaturas extremas, procurando compreender os mecanismos moleculares que regulam este processo. Diante do fenómeno das alterações climáticas, acreditamos que são necessárias duas abordagens complementares. A primeira, consiste em minimizar as alterações, com esforços direcionados à limitação da emissão de dióxido de carbono e outros gases com efeito de estufa. A segunda, envolve a nossa adaptação, nomeadamente na produção de alimentos, procurando compreender os mecanismos subjacentes de modo a percebermos como intervir da forma mais eficaz. Estas são algumas das áreas em que estamos a atuar. A nível internacional, todos estes projetos têm uma dimensão e impacto significativos. A ciência que fazemos transcende as fronteiras do país, tendo uma projeção global, e é assim que nos posicionamos no cenário científico internacional.
De que forma considera que o Município de Oeiras tem contribuído para o desenvolvimento científico e tecnológico em Portugal?
O Município de Oeiras tem desempenhado um papel fundamental na região e desenvolveu um modelo de parceria com as instituições de ensino e de investigação que poderão servir de inspiração a outros municípios. A nossa colaboração abrange um leque variado de atividades, como a dinamização de clubes de ciência, projetos de ciência cidadã e a participação do ITQB no Conselho Geral de Escolas. Este envolvimento não é artificial, mas sim muito próximo, especialmente com as escolas do município. A relação com os munícipes, as escolas e os cidadãos é extremamente relevante para nós.
Além disso, Oeiras tem investido em atividades de inovação, incluindo a atribuição dos prémios InnOValley, que reconhecem projetos de inovação e prova de conceito com potencial para se transformarem em produtos com benefícios reais para os cidadãos. Trabalhamos também, em conjunto, numa vertente de internacionalização, procurando trazer mais eventos para o concelho, conferências científicas e investigadores. Como disse, e quero enfatizar, o Município de Oeiras tem sido excecional neste processo e poderá servir de modelo para outros municípios. Esta relação tem sido vital para mitigar o que considero ser um subfinanciamento da ciência no nosso país. Embora seja uma crítica comum, é uma realidade que o financiamento insuficiente da ciência cria desafios verdadeiramente difíceis de superar.
Em que outra área gostaria de ver Oeiras a investir?
Quando pensamos nas nossas instituições, percebemos que o mais relevante são as pessoas que dela fazem parte: os nossos investigadores e colaboradores. É essencial que estas pessoas, além de estarem profundamente empenhadas e comprometidas com a instituição, possuam talento e criatividade. Contudo, para que uma instituição cresça forte, é fundamental que disponha de mecanismos de funcionamento adequados, que incentivem o envolvimento de todos.
A capacidade de reter pessoas talentosas está intimamente ligada ao financiamento, e esta é uma dificuldade que temos sentido. Embora o apoio do Município de Oeiras seja significativo, não é suficiente para superar todas as dificuldades que enfrentamos. É crucial que o Município de Oeiras continue a investir nas áreas em que já colabora connosco. Manter as atividades que temos é vital, mas gostaria de destacar dois tipos de apoios que considero essenciais.
Em primeiro lugar, é necessário que o município invista em infraestruturas para acolher cientistas, especialmente jovens investigadores. A falta de condições de alojamento torna-se uma barreira para atrair novos talentos. Sei que o município tem feito esforços nesse sentido, mas seria benéfico reforçá-los ainda mais.
Outra área de interesse é a aquisição de equipamentos únicos, essenciais para a realização de investigação na fronteira do conhecimento. Uma parceria com o município nesta área seria muito importante. Criar infraestruturas de excelência é um desafio, mas, em conjunto com o município, poderíamos identificar áreas estratégicas para investir em grandes equipamentos e infraestruturas, reforçando a nossa posição tanto a nível nacional como internacional.
Este é um trabalho que deve ser realizado em conjunto com a Câmara, como tem sido feito até agora, de forma a identificarmos oportunidades de investimento.