
Nesta edição do Rostos da Ciência apresentamos Guilhermina Nogueira – Professora de Física e Química do Ensino Secundário – e Cristina Dias – Professora de Biologia e Geologia do Ensino Secundário -, os rostos que coordenam o Clube Ciência Viva na Escola do Agrupamento de Escolas de Paço de Arcos (aePA) – sediado na Escola Secundária Luís de Freitas Branco, em Paço de Arcos – e têm inspirado os jovens de hoje a explorar a sua paixão pela ciência. Quem sabe se não serão estes jovens os cientistas de amanhã.
Em 2018, no âmbito da candidatura à integração nos Clubes Ciência Viva na Escola, é lançado o desafio ao Departamento de Matemática e Ciências Experimentais para criar um clube de ciência na Escola Secundária Luís de Freitas Branco, associando-se ao grupo de Paleontologia, já existente na Escola Básica Joaquim de Barros e coordenado pelo professor Celestino Coutinho.
Surge, assim, o grupo de Matemática e Ciências Experimentais, numa colaboração entre os professores João Afonso (Matemática), Cristina Dias (Biologia e Geologia – coordenadora) e Guilhermina Nogueira (Física e Química – coordenadora). Estes dois grupos associam-se constituindo o “CCV na Escola aePA” [Clube Ciência Viva na Escola do Agrupamento de Escolas de Paço de Arcos] , que apresenta como parceiros iniciais o ITQB Nova (Instituto de Tecnologia Química e Biológica António Xavier), o LIP (Laboratório de Instrumentação e Física Experimental de Partículas) e a Câmara Municipal de Oeiras.
Posteriormente associam-se novos parceiros como o IST (Instituto Superior Técnico), o INIAV (Instituto Nacional de Investigação Agrária e Veterinária) e o CBR (Catolica Biomedical Research Center). O CCV na Escola aePA passou a ter um novo espaço de trabalho na Escola Secundária Luís de Freitas Branco, iniciando aí a sua atividade em janeiro de 2019, com alunos do secundário e do 3º ciclo.
O primeiro projeto do Clube consistiu na construção de um carro solar e participação na 5ª grande corrida de carros movidos a energia solar – VS-SOLAR CHALLENGE. Este desafio foi lançado pelo Departamento de Educação da Câmara Municipal de Oeiras. Ainda nesse ano, a convite do ITQB Nova, o Clube participou no dia aberto desta instituição. Internamente os alunos do clube dinamizaram diversas atividades no dia dos Laboratórios abertos da Escola Secundária Luís de Freitas Branco.
Os alunos que integram o clube fazem-no no horário não letivo, mostrando uma curiosidade natural pela Ciência e vontade de experimentar, investigar, construir, para além do que se faz em sala de aula e muitos apesar de não terem certezas quanto ao futuro, vêem-se a seguir cursos científicos.
Assim, quando surgiu a necessidade de o clube adotar um lema, das várias ideias apresentadas os “Clubistas” escolheram esta [Curiosos hoje, cientistas amanhã!] com a qual mais se identificaram. Um dos grandes desafios do Clube tem sido o desenvolvimento de projetos / atividades que continuem a atrair alunos e que mantenham o entusiasmo pela ciência. Neste âmbito o trabalho colaborativo entre os professores do clube e com os nossos parceiros tem sido a chave do sucesso!
Acompanhando os percursos académicos dos antigos alunos “Clubistas” verificamos que a grande maioria frequenta cursos científicos e alguns integram núcleos de ciências / tecnologias, nas respetivas universidades. Os “Clubistas” atuais mantêm essa curiosidade e entusiasmo pela ciência e manifestam interesse em seguir cursos na área científica.
Uma das finalidades do clube é promover nos alunos de todo o agrupamento o gosto pela Ciência, nomeadamente através da divulgação de projetos, competições científicas, eventos de ciência, encontros com cientistas, entre muitas outras iniciativas. As competições científicas são eventos importantes para os alunos uma vez que há uma valorização do seu desempenho e/ou trabalho realizado ao incentivar a sua divulgação para além da comunidade escolar permitindo-lhes, ainda, o desenvolvimento de competências, por exemplo, no âmbito da comunicação.
Muitos “Clubistas”, inerente à sua curiosidade e carácter empreendedor manifestam grande recetividade a este tipo de atividades, para as quais são sistematicamente incentivados e apoiados. Para incentivar mais alunos do agrupamento a participarem neste tipo de competições, fazemos uma divulgação sistemática junto dos professores do Departamento de Ciências, disponibilizando-nos para lhes darmos apoio, nomeadamente com a colaboração dos nossos parceiros.
Destacamos a participação de alunos do clube ou de outros alunos, no âmbito de projetos coordenados pelo clube, nas seguintes competições:
Concurso ”Ciência em Casa”, Projeto Quark! Escola de Física para Jovens, Congresso Nacional de Cientistas em Ação, Congresso Biofase – I Congresso de Investigação em Bioengenharia no Ensino Secundário. O Concurso ”Ciência em Casa” é-nos muito caro, uma vez que, consistiu numa competição interna, dirigida a alunos do agrupamento, desde o 1.º ciclo até ao 12.º ano, e cuja implementação contou com a cooperação entre os alunos e professores do clube, o ITQB Nova e o Departamento de Educação da Câmara Municipal de Oeiras.
Claramente se verifica que a predisposição que os alunos têm para desenvolver uma aprendizagem centrada na experimentação possibilita e potencia a sua participação em projetos desafiadores. O primeiro grande projeto desafiador foi a construção do carro solar e a participação na Corrida VS-SOLAR.
Os nossos parceiros – nomeadamente o ITQB – têm-nos desafiado, sistematicamente, a participar em projetos que para os nossos alunos são desafiadores, nomeadamente a dinamização de atividades nos seus dias abertos, e comemoração de outros eventos, como a Noite dos Investigadores, o Dia do Microrganismo, o Dia do Fascínio das Plantas. Marcámos presença, com atividades, em todos eles. Há dois anos propusemos ao ITQB a introdução de uma atividade no Oeiras Educa para alunos do 2.º Ciclo – “Ser Microbiólogo com o CCV aePA” e a adesão dos alunos do clube e de outros alunos fora do clube foi imediata.
Internamente temos a participação do Clube nos laboratórios abertos direcionado a alunos do 6.º ano do agrupamento. Não podemos, ainda, deixar de salientar o Trabalho de Projeto que há cerca de 5 anos foi implementado em todas as turmas do 12.º ano de Biologia, Física e Química. No caso da Biologia é o nosso parceiro o ITQB Nova, que nos desafia a propor aos alunos a realização de trabalhos de projeto mentorados por investigadores da instituição. Apesar de exigir mais dedicação por parte dos alunos e trabalho fora da componente letiva, o feedback foi sempre positivo e de manutenção do projeto.
No 12.º ano de Física, o apoio técnico e de materiais do InovLabs possibilita a construção de projetos físicos. Esses projetos, para além da Física, envolvem áreas de programação e eletrónica e permitem o desenvolvimento de competências técnicas e tecnológicas que se revelam cada vez mais importantes no acesso ao mercado de trabalho.
No que respeita às olimpíadas da Biologia, Biotecnologia e Geologia não se tem verificado um incremento da participação dos alunos; alguns dos nossos alunos, incentivados por nós participam. A maioria dos alunos considera estas competições muito teóricas. Relativamente às olimpíadas de Física, os alunos têm no Clube um espaço de debate e de treino para alcançarem um melhor desempenho.
Guilhermina Nogueira:
Citando Eric Mazur, professor de Física de Harvard aquando entrevistado por Carlos Fiolhais e Carlos Pessoa, in Gazeta de Física, “Ensinar é apenas ajudar a aprender”. É sabido que nas aulas convencionais não há tempo para pensar e espera-se que essa assimilação seja feita após aula. Na maioria das vezes, os alunos, além de não terem “esse tempo para assimilar”, têm fragilidades em encadear com lógica o raciocínio e sozinhos descuram o pensamento crítico. Constata-se que o cérebro armazena melhor modelos do que factos. Por isso, em Física é essencial trabalhar com modelos.
Assim a prática de ensino em sala de aula, começa por uma questão problema, que após discussão em grupo turma ou grupo de trabalho é planificada a experiência e validada a previsão teórica relativa à solução da questão em estudo. Este processo em que se desenvolve um modelo mental de assimilação de informação conduz a uma aprendizagem significativa e constitui a metodologia de trabalho no Clube.
Os alunos do Clube estão recetivos e expectantes. Em sala de aula, por vezes é difícil conseguir que os alunos “precisem de aprender”. Esta situação é, em parte, explicável pois os alunos têm interesses diversos! Considero que as interações com os alunos no Clube, as atividades e projetos desenvolvidos no âmbito do Clube facilitam o modo como envolver os alunos em contexto de sala de aula. Realço ainda que, pelo facto de alguns alunos do Clube serem também meus alunos, são envolvidos na dinâmica das aulas e exemplificam que “a melhor forma de aprender é ensinando alguém”.
Cristina Dias:
A minha experiência direta com os alunos no clube permitiu-me ter uma perspetiva mais precisa das suas expetativas relativamente à Biologia e à Geologia, bem como das suas dificuldades. Esta perspetiva contribuiu para o desenvolvimento de estratégias que, em contexto de sala de aula, os motive para a aprendizagem nestas disciplinas, sobretudo na Geologia. Alunos motivados estão disponíveis para aprender. Gostaria de salientar que o sucesso do processo ensino-aprendizagem é maioritariamente resultado de um trabalho colaborativo entre vários protagonistas, nomeadamente entre professores.
Um dos grandes constrangimentos com que eu e os meus colegas de grupo nos deparamos é a falta de materiais, que condiciona a implementação de atividades práticas experimentais. A este nível o clube está a dar um importante contributo. Por um lado, temos os materiais que os alunos constroem e os protocolos que desenvolvem, para serem utilizados nas aulas práticas, nos diversos níveis de ensino. Os nossos parceiros, nomeadamente o ITQB e a Câmara municipal de Oeiras, também têm disponibilizado materiais que possibilitam a realização de atividades de carácter experimental, que não estavam ao nosso alcance, com os recursos de que dispomos.
Outra mudança impactante foi o desenvolvimento de Trabalhos de Projeto por todos os alunos do 12º ano de Biologia, acompanhados por investigadores do ITQB e ainda do INIAV. Esta experiência permite-lhes contactar diretamente com a realidade do trabalho dos investigadores, acompanhando todo o processo investigativo, tendo também perceção dos diversos constrangimentos existentes.
No Clube, o caráter individual da aprendizagem que restringe e condiciona a metodologia implementada em sala de aula é incorporado de modo que os alunos possam progredir a ritmos diferentes, resolvendo os problemas de maneira diferente e de acordo com o seu perfil de campos de interesse e evoluam progressivamente. Deste modo, a ciência mostra-se apelativa e até “viciante”.
A diversidade de professores no clube com possibilidade de desenvolver diferentes tipos de atividades contribui para atrair alunos com interesses diversos. O trabalho colaborativo com os parceiros é fundamental, quer através da disponibilização de recurso materiais e humanos, quer através dos desafios que nos vão lançando. E claro o trabalho colaborativo com os pares, são os professores os grandes divulgadores da ciência junto dos seus alunos. O Clube funciona como uma faísca para os alunos e para os professores!