O Comissário da Candidatura OEIRAS 27, Jorge Barreto Xavier, conversou com o Oeiras Valley sobre os diversos pilares da candidatura de Oeiras a capital europeia da cultura em 2027.
O Diretor Municipal e Comissário da Candidatura OEIRAS 27, Jorge Barreto Xavier, esteve à conversa com o Oeiras Valley para falar sobre os projetos a serem desenvolvidos pelo Município de Oeiras, no âmbito da candidatura a capital europeia da cultura em 2027.
Leia a entrevista e conheça os diversos pilares da estratégia Oeiras 27, desde a ideia de transformar Oeiras num ecossistema urbano à valorização do património identitário do concelho. O Comissário Jorge Barreto Xavier explica, ainda, como o executivo da Câmara Municipal de Oeiras olha para o setor cultural como uma peça estruturante da estratégia do município para os próximos dez anos.
Comissário Jorge Barreto Xavier, a candidatura a Capital Europeia da Cultura 2027 é um dos grandes compromissos que o executivo de Oeiras traz para este novo mandato. O que é que os oeirenses podem esperar desta candidatura?
Aquilo que esperamos é que o projeto do Oeiras27 possa contribuir de uma forma estruturante para o novo ciclo de desenvolvimento do concelho de Oeiras. Neste novo ciclo, o que Oeiras pretende é transformar-se numa cidade verde e azul.
Não estamos a falar de uma cidade em termos administrativos, mas de uma cidade em termos conceptuais, orgânicos e de vida: A cidade enquanto espaço dos cidadãos.
Um território que corresponde a um lugar para viver, para trabalhar, para aprender, para ter cultura, para ter descanso, e que tudo isso se desenvolva com grande fluidez, mobilidade e proximidade. A cultura aqui tem um papel absolutamente estruturante. Ela servirá como âncora e cimento para a construção desta cidade de Oeiras.
“É uma candidatura que queremos ganhar, mas é, também, um posicionamento estratégico de Oeiras para os próximos dez anos”
Oeiras27 é um projeto de candidatura para sermos capital europeia da cultura, sim, mas é, ao mesmo tempo, um contributo ativo para esta ideia contemporânea de ordenamento de território.
Nós ao ligarmos aquilo que é material ao imaterial, ao ligarmos o espaço de vida das pessoas ao sentido de vida das pessoas, estamos a contribuir para a qualificação do território, para o seu reposicionamento no contexto da área metropolitana de Lisboa e para o seu posicionamento nacional e internacional.
É uma candidatura que queremos ganhar, mas é, também, um posicionamento estratégico de Oeiras para os próximos dez anos.
Os portugueses estão habituados a conhecer a cultura como o parente pobre dos vários orçamentos estatais e autárquicos. Qual é a estratégia de Oeiras por detrás deste grande investimento cultural e que mensagem se poderá passar aos outros órgãos do poder central e local?
De facto, os municípios têm hoje, em termos percentuais, um gasto com cultura muito superior àquele que é feito pelo Ministério da Cultura. O montante somado das despesas dos municípios portugueses com cultura é significantemente superior ao orçamento do Ministério da Cultura.
O orçamento municipal é dedicado a desenvolver o tecido cultural do concelho, a desenvolver eventos e programações, atividades dos mais diversos tipos, seja formativa, seja para cultura amadora ou erudita.
“A cultura aqui não é vista como uma despesa, mas como um investimento”
Oeiras é, felizmente, um concelho com uma vida cultural muito intensa. O que nós procuramos agora é dar-lhe consolidação – tanto ao nível programático, como ao nível das estruturas – para que possamos dar um salto, que faz parte desta estratégia integrada de desenvolvimento.
A mensagem que se pode passar é que o investimento infraestrutural e programático que estamos a fazer não olha para a cultura como aquilo que se faz no fim de estar tudo o resto feito.
A cultura aqui não é vista como uma despesa, mas como um investimento. Um investimento em infraestrutura e em pessoas: naqueles que aqui vivem, naqueles que nos visitam e naqueles que nos poderão vir a visitar.
A candidatura apresentada por Oeiras assenta em cinco pilares estratégicos. Começando pelo pilar do ecossistema urbano, pode explicar a ideia apresentada de criar diversas praças centrais em Oeiras e de como estas irão funcionar?
O projeto Oeiras27 tem um conceito chapéu, que abrange todos os outros, que é a ideia de ecossistema urbano. Esta ideia está inteiramente em consonância com a ideia de cidade verde e azul que é, no fundo, o parâmetro definidor do trabalho sistémico deste mandato.
Hoje, infelizmente, vivemos em emergência climática. Não podemos estar nesta ideia de negacionismo de que não há alterações climáticas e de que não tem nada a ver com a vida que levamos. Tem e está mais do que demonstrado. Vamos ter problemas muito sérios ainda nas nossas vidas e vamos deixar problemas ainda mais sérios para as gerações vindouras.
Alterar isto passa por alterar a nossa cultura de vida. A cultura não é só artes e espetáculos, mas também a maneira como olhamos para o mundo e para nós próprios. O contributo que queremos dar é ajudar a ver o território de maneira diferente.
“Um território urbano não tem de ser um território inimigo do ecossistema”
Um território urbano não tem de ser um território inimigo do ecossistema. Os territórios urbanos podem ser ecossistemas urbanos: espaços de equilíbrio entre o homem e a natureza.
Hoje, mais de 60% dos europeus vivem em cidades. É nas cidades que se desenvolvem parte relevante dos fenómenos poluentes e dos fenómenos que causam danos na vida do planeta. É também nas cidades que se tomam as decisões que afetam a produção industrial, agrícola e alimentar.
Aquilo que nós queremos é contribuir para as perspetivas e para os comportamentos no âmbito do espaço urbano, com atividades concretas que tenham uma dinâmica cultural, mas, também, esta vertente ambiental.
O Parque dos Poetas e o Templo da Poesia são locais emblemáticos de Oeiras. Como é que se pretende, a partir destes espaços, celebrar a literatura e a poesia e que mais iniciativas estão preparadas neste âmbito?
Oeiras é muito forte nas possibilidades em torno da poesia e tem no seu território o Parque dos Poetas. Este parque é o maior parque do género na Península Ibérica e um dos maiores no contexto europeu. É um ativo que devemos valorizar junto da nossa população, assim como no contexto da área metropolitana de Lisboa e ao nível nacional e internacional.
Por isso, tomámos o Parque dos Poetas como um dos elementos de referência da candidatura de Oeiras a capital de cultura 2027 e dos projetos que estamos a desenvolver. Nesse sentido, as atividades já começaram a acontecer. Já começou este ano a Mostra de Arte da Palavra, que é exatamente um projeto em torno da poesia e do desenvolvimento da língua associada às várias artes. Vai acontecer também a primeira bienal de poesia internacional em Oeiras. Estes projetos irão ocorrer até 2027.
“É um trabalho de construção em torno da linguagem, através da poesia, mas que faz parte de uma estratégia identitária”
Estamos a desenvolver ainda, junto das escolas, uma série de projetos que visam óticas editoriais ou a presença da poesia no espaço público. O Templo da Poesia e o Parque dos Poetas estão no coração destas dinâmicas programáticas.
É um trabalho de construção em torno da linguagem, através da poesia, mas que faz parte de uma estratégia identitária. Uma identidade oeirense que é obviamente plural. Oeiras é um concelho com 117 nacionalidades. Queremos que as várias línguas e formas de expressão destas línguas apareçam no projeto e queremos abranger todas as gerações e o território no seu todo.
Esta candidatura acarreta consigo a construção de novos auditórios, centros culturais, museus, assim como a requalificação de outros espaços já existentes. O que é que a modernização e a introdução de novos equipamentos irão significar para a vida cultural de Oeiras?
Eu creio que é uma mudança muito significativa e que acrescenta muito àquilo que Oeiras já atingiu. Estamos a falar neste lugar magnifico que é o Palácio Marquês de Pombal. Um palácio que a Câmara tem preservado e recuperado.
A proposta que foi feita é que possamos também avançar para a criação de um museu de arte, ciência e tecnologia aqui. Um projeto com uma dimensão museológica, associada à investigação e à educação, com a associação dos centros de investigação e empresas do concelho. Acreditamos que vamos desenvolver aqui um espaço muito competitivo e valorizador para os residentes e para quem nos visita.
Isto é um dos vários projetos em curso. Podemos falar da Bateria do Areeiro, que se vai transformar na primeira unidade do Museu do Tejo, no Mosteiro da Cartuxa, que vai receber um centro de arte contemporânea virado para um conjunto de atividades de artes visuais, no espaço do antigo intermarchê, em Porto Salvo, que está a ser preparado para ser um grande hub de indústrias criativas na área da arte, ciência e tecnologia, nos projetos que estamos a preparar para a criação do centro cultural de Linda-a-Velha, que vai ter um auditório de 1400 lugares e que será uma das salas mais qualificadas para artes de espetáculo ao nível nacional.
“Estamos a usar esta candidatura como elemento catalisador, mas o fim deste trabalho vai bem para lá da mesma”
Tudo isto associado ao conjunto de praças que irão ligar o território em vários pontos de Oeiras, como uma espécie de nós de rede da organização da ideia de cidade de Oeiras.
Nestas praças serão programadas atividades de ar livre com atividades culturais, com atividades lúdicas, mas também com pontos de encontro para debater a cidadania, a situação do ambiente ou para fazer reuniões descentralizadas do município…
Espaços com imensas possibilidades, a que vai estar associada tecnologia, ecrãs, sensores, que irão permitir às pessoas estarem numa praça e ver um espetáculo que decorre noutra, fazer projetos conjuntos nas diversas praças, entre outras ideias.
Entre aquilo que são os equipamentos que estamos a criar e o desenho urbano orientado para esta ideia de cidade verde e azul, o concelho irá ganhar muito, independentemente de ganharmos a candidatura à capital europeia da cultura 2027.
Estamos a usar esta candidatura como elemento catalisador, mas o fim deste trabalho vai bem para lá da mesma.
A valorização do património de Oeiras, seja este material ou imaterial, assim como o acesso do público ao mesmo, será uma das grandes lutas desta candidatura. Quais são os grandes objetivos da Câmara nesta matéria?
No que diz respeito ao património material, temos uma frente de rio e de mar com 12 km, que concentra o maior número de fortificações marítimas do conjunto das fortificações marítimas da Barra do Tejo, que, no seu conjunto, representam o maior conjunto de fortificações marítimas do mundo.
Tendo Oeiras o número mais significativo dessas fortificações, estamos a trabalhar na reabilitação desse património, ligando-o também à existência de um dos dois primeiros aquários da Europa, o Aquário Vasco da Gama.
Além disso, temos a reabilitação, que tem sido consistente, do património religioso edificado. Temos o trabalho de reabilitação da Fábrica da Pólvora da Barcarena, a chamada Fábrica de Cima. Acrescente-se a reabilitação do Convento da Cartuxa, o trabalho que está a ser desenvolvido na Quinta real de Caxias, a Casa de D. Miguel em Queijas ou tantos outros projetos que estão a ser desenvolvidos. Este é um trabalho muito relevante.
“Queremos que as pessoas conheçam melhor todo este património. Queremos divulga-lo e torná-lo mais evidente”
Associado a todo este património construído, temos o património móvel que envolve esculturas, pinturas e outros tipos de manifestações de património, que nos interessa proteger e valorizar.
Depois temos o património imaterial: tradições religiosas, tradições militares – Oeiras tem uma história militar muito relevante ao longo dos séculos –, tradições piscatórias, tradições desportivas – Oeiras tem o maior complexo desportivo do país, o complexo do Jamor, a Cidade do Futebol, mas está também muito ligada ao hóquei em patins.
Apesar de não ser uma potência na área do surf, Oeiras tem várias pessoas com grande ligação ao surf, a sua frente de mar, há também um grande património imaterial associado a esta prática desportiva. Há ainda o que diz respeito ao nosso património gastronómico.
Queremos que as pessoas conheçam melhor todo este património. Queremos divulga-lo e torná-lo mais evidente e isso terá também um impacto económico positivo muito relevante.
Em relação ao património marítimo oeirense, já sabemos que um dos principais objetivos passa pela requalificação e pela abertura ao público das diversas fortificações. Que mais se pode esperar desta dimensão do Oeiras27?
No âmbito do património marítimo, queremos, de facto, trabalhar na linha de costa que tem a gestão do município. Esperamos que haja uma gestão ampliada porque há a expectativa legítima de que as áreas na gestão do Porto de Lisboa passem para o Município de Oeiras.
Queremos dar, também, maior dinâmica à parte subaquática. O estuário do Tejo é um dos maiores cemitérios de navios do mundo. A entrada na Barra do Tejo era muito difícil, por causa das correntes, das orientações e das horas em que era possível entrar, o que provocou muitos naufrágios. Como se sabe, Lisboa foi uma potência marítima durante séculos e há, portanto, muito trabalho a fazer, seja ao nível da exploração subaquática, seja ao nível do turismo, do mergulho e da evidência histórica de todo esse material.
Há, ainda, a fruição do rio, que tem de ser mais forte. A articulação com o Farol do Bugio e toda a matéria que diz respeito à aprendizagem desportiva, lúdica e de utilização do rio tem que ser melhorada.
Há cerca de dois anos foi nomeado para a função de Diretor Municipal de Educação, Desenvolvimento Social e Cultural da Câmara Municipal de Oeiras. O que difere este cargo de outros que já teve no passado, como vereador, e como avalia os seus dois últimos anos de trabalho ao serviço dos oeirenses?
Eu tenho tido sorte. Haverá aspetos que terão a ver com competência, mas, neste caso, tive a sorte de ser convidado pelo Presidente da Câmara para exercer funções aqui no Município. Já tinha estado aqui há 20 anos como vereador e depois desenvolvi várias funções a nível nacional e internacional, públicas e privadas.
É um regresso feliz e estou muito contente por estar novamente ao serviço de Oeiras e dos oeirenses. Tive, entretanto, no desempenho das minhas funções, e como tantos outros portugueses, um constrangimento de contexto relevante, porque cheguei em setembro de 2019 e a pandemia começa a ser conhecida em janeiro de 2020.
Obviamente que, na área da cultura, as dinâmicas relacionais são absolutamente essenciais. Temos estado a gerir aquilo que é um trabalho de estratégia que não parou, antes pelo contrário, e conseguimos fazer muito trabalho, que agora está a ter a sua concretização. A Câmara de Oeiras conseguiu, também, manter muita da sua programação cultural, para lá daquela que teve de ser adiada por causa da pandemia de Covid-19.
“O Município de Oeiras é uma referência nacional em termos de prestação de serviço público, mas quem faz bem, quer sempre fazer melhor e essa é a marca cultural de Oeiras”
No que diz respeito a outras partes da minha tarefa enquanto diretor municipal, como na área da educação ou na área social, julgo que fomos muito capazes. Oeiras foi capaz de dar uma resposta de muita proximidade na situação pandémica, graças à liderança política e ao trabalho de todo o corpo de dirigentes e colaboradores.
Se falarmos nas áreas do Desporto, da Juventude ou do Turismo, que também estão nesta direção municipal, foi possível desenvolver um trabalho consistente, mas houve impactos negativos que temos de ultrapassar. Não deixámos, por isso, de preparar o futuro.
Ansiamos todos por um pós-pandemia para podermos trabalhar entre nós de uma maneira mais próxima e integrada. Penso que podemos prestar um serviço público ainda mais forte do que aquele que já se pratica. O Município de Oeiras é uma referência nacional em termos de prestação de serviço público, mas quem faz bem quer sempre fazer melhor e essa é a marca cultural de Oeiras.